1. Como conheceu o trabalho do Henfil?
Eu era adolescente e vi alguns números da série do Fradim, na casa de primos em MG. Mas ao mesmo tempo, pouco depois, ele começou a aparecer no programa televisivo da Globo, o “TV Mulher”, fazendo a esquete “TV Homem” (que era um quadro de humor em preto e branco). Eu assistia e gostava muito. E depois, quando fui chegando à maturidade comecei a entender melhor as situações críticas que Henfil inseria nos Fradim e nas HQs da Graúna, Zeferino etc.
2. Qual foi o impacto inicial?
Os desenhos e traços caligráficos dele, que eram muito expressivos e eu adorava. E o próprio Henfil na TV Homem (dentro da TV Mulher) que era muito hilário.
3. O que chamou mais atenção: o humor escrito, as gags visuais ou o traço?
Tudo junto e misturado: as expressões incrivelmente verossímeis, ainda que caricaturais do desespero do Fradim quando o Baixim o punha em maus lençóis, o sofrimento pueril da Graúna, a sapiência ativista do Bode Orelana...eram desenhos e sequências impactantes, pois traziam expressões fortíssimas.
4. Seu trabalho teve influência direta?
Não, porque meu traço não é de humor e nem caricatural. Mas há certa semelhança na criação “automática”. Li numa entrevista dada por Henfil que quando ele estava dentro de sua criação, se tivesse que desenhar um carro, ele saía excelente. Mas se pedissem a ele um, fora de seu contexto criativo, saía ruim, segundo ele. Fiz a analogia com meu processo criativo: se estou na fluidez do momento da criação (quase como uma escrita desenhada surrealista direta à nanquim), saem minhas artes com impacto que devem ter (fantástico-filosófico). Mas se não estou imbuído deste momentum, minha criação é fraca. Quando li a fala de Henfil, imediatamente entendi que ele tinha um processo criativo em que o meu era similar, apesar dele fazer humor ácido e crítico e eu HQs de cunho filosófico e fora do caricatural!
5. Qual foi a impacto dos Quadrinhos e Charges do Henfil na Imprensa Sindical?
Para mim, o que importava mais era a situação de miséria que ele mostrava do Brasil com os personagens da caatinga. Eu não tinha esta verve política atual, pois eu era ainda um jovem adolescente que lia gibis de humor e de heróis. Mas entendia a “seriedade” das denúncias que ele trazia em suas artes de humor ácido, ligeiro e inteligentes.
6. Acompanhava as entrevistas do Henfil na Imprensa?
Sim. Além da que relatei na questão 4, tinha uma outra que, se não me engano, ele deu à revista Caros Amigos, que foi uma longa entrevista mas muito inusitada e até com pontos espiritualistas com tópicos incríveis que eu jamais havia lido antes!
7. O que achou da iniciativa da Editora Noir em reunir estas entrevistas em um livro?
Eu não sabia desta iniciativa, mas apoio. Principalmente – esqueci-me de dizer – adorava ler as cartas que ele enviava à mãe, de quando morou nos EUA e as publicava na sua série do Fradim.
8. Conheceu o Henfil multimídia na TV e no Cinema?
Como disse, conheci-o mais nos quadrinhos e na TV homem. Também e li Henfil na China que muito me marcou igualmente.
9. Qual é o tamanho da falta que Henfil faz?
Não sei como ele estaria nos tempos atuais. Mas a cada um – penso – lhe é dado seu tempo e seu afazer. Ele foi fenomenal na sua época e denunciou pra valer o “mostra a sua cara, Brasil”. Atualmente há outros cartunistas como Latuff e mesmo Laerte, e Angeli, que até dão conta do recado, em certa instância. Mas realmente, a pungência do Henfil marcou uma época que foi preciosa nas artes gráficas, da denúncia, pelos cartuns e charges dele. Memso nos EUA, não entendiam o humor dele e ainda fechavam seus desenhos e punham bendays (parece que não conseguiam aceitar os desenhos caligráficos e gestálticos dele, que a gente une mentalmente ao visualizar – neste ponto, éramos mais avançados que o norte-americano médio, aparentemente, na degustação da arte dos desenhos).
10. As novas gerações conhecem pouco do trabalho do Henfil. O que fazer pra melhorar isso? O livro organizado pelo Gonçalo Jr pode ajudar?
Creio que sim. Os livros ajudam a manter a memória. Exposições também. E, claro, trabalhos de pesquisa acadêmicos.
11. O Brasil hoje está 'sick da vida' com tantos ataques à democracia, à inclusão social, racial e de gênero, à distribuição de renda? Ou a coisa precisa piorar mais pro povo reagir?
Acho que sempre esteve. Cada período, de seu jeito. Mas é inegável que nalguns períodos a coisa toma mais vulto que noutros, como neste (des-)governo atual.
12. Como Henfil estaria reagindo à sanha fascista, totalitária e anti-democrática que abocanhou os três poderes?
Acho que ele estaria sendo caçado, até, e/ou ameaçado de morte, talvez.
13. Henfil foi um dos fundadores do PT, que se propunha a transformar radicalmente a sociedade. Esta décima terceira pergunta é o espaço pra suas considerações, não finais, mas futuristas. É possível ainda transformar o país de forma radical? O humor entra nisso?
Impossível que todos comunguem de um mesmo pensamento radical e/ou político. O que se necessita talvez, é um pouco mais de coerência, além de “cor” – de coração e amor. Henfil amava a vida, amava sua mãe e amava a arte. Isto transparecia mesmo quando ele parecia bradar lutando. Creio que o que falta é isto. Este governo conseguiu matar a compaixão e o amor, e fincou a bandeira exclusiva do ódio.
Gazy Andraus é membro da AQC, um dos organizadores do Troféu Angelo Agostini, pós-doutorando pelo PPGACV da FAV-UFG (Bolsista CAPES-PNPD), Doutor pela ECA-USP, Mestre em Artes Visuais pela UNESP, Pesquisador e membro do Observatório de HQ da USP, Criação e Ciberarte (UFG) e Poéticas Artísticas e Processos de Criação (UFG). Também publica artigos e textos no meio acadêmico e em livros acerca das Histórias em Quadrinhos (HQs) e Fanzines, bem como também é autor de HQs e Fanzines na temática fantástico-filosófica.
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